[ver pdf]

Luís Cardoso, Presidente
Instituto Piaget
Macedo de Cavaleiros, 17 de Julho de 2003


Filmagem vídeo: Nuno Beira
Transcrição: Ana Cabral
Edição: Eduardo Beira
V0, 9 de Agosto de 2003

Luís Cardoso:
O Instituto Piaget instalou-se em Macedo de Cavaleiros no princípio da década de noventa. Iniciou a sua actividade apenas com o curso de Educadores de Infância numas instalações provisórias (um pavilhão pré-fabricado). Nessa altura iniciou um projecto de base de instalação do ensino superior em Macedo Cavaleiros. Iniciou o processo de construção instalações de raiz, criando uma Escola Superior de Educação e posteriormente uma Escola de Enfermagem que se veio a transformar recentemente na Escola Superior de Saúde. Criaram-se essas instalações de raiz excelentes e adequadas aos fins a que se destinam e iniciou-se um processo de recrutamento de docentes, preparando a sua formação. Estes dois factores, aliados a um projecto pedagógico que está por trás de tudo isto, resultou num crescimento enorme do Instituto Piaget em Macedo de Cavaleiros, ao ponto de hoje contar-mos com essas duas escolas e com 1862 alunos. Contamos ainda com um quadro de docentes que se aproxima dos 150, e cerca de 70 funcionários.
Esta população escolar, graças à nossa presença em Macedo de Cavaleiros, numa vila que também passou a cidade só pode ter um impacto extremamente grande em todos os níveis. O primeiro impacto é a nível económico, que se nota ao nível do número de casas e prédios construídos, de lojas e cafés. Por outro lado teve um impacto muito grande em termos socioculturais, porque passaram a ter lugar em Macedo de Cavaleiros um conjunto de iniciativas e um conjunto de actividades que se destinavam essencialmente aos estudantes, e por outro lado essas actividades passaram a decorrer no Instituto Piaget que passou a ser o centro aglutinador da maioria das actividades desse tipo que se desenvolvem na cidade.

Eduardo Beira:
O impacto do Instituto Piaget aqui em Macedo faz-se sentir desde 1990. Como é que são as ligações entre o Instituto e a região, para além de Macedo de Cavaleiros?

Luís Cardoso:
Dentro do nosso projecto, nós entendemos que uma instituição, e isso faz parte dos nossos estatutos, deve defender a nossa iniciativa preferencialmente em zonas do interior. Como somos um cooperativa sem fins lucrativos, os nossos estatutos consagram que devemos contribuir de uma forma decisiva para as regiões do interior onde nos vamos instalar. Isto pressupõe que há uma filosofia de suporte e que ao iniciarmos uma actividade numa região do interior, uma das principais preocupações é que haja uma simbiose perfeita entre a comunidade de escola e a comunidade alargada onde nos instalamos. É evidente que num curso de formação de professores começamos por estabelecer parcerias com todas as escolas, ou seja passamos a intervir em todas as escolas da região, desde a educação pré-escolar, primeiro e segundo ciclo. Ao nível da saúde, uma vez que somos a segunda maior escola a formar enfermeiros no país, somos obrigados a ter implicações permanentes com todos os centros de saúde e com todos os hospitais não só da região, porque fazemos estágios em Lisboa, Porto e Coimbra, mas em primeira mão com as instituições da região, através da celebração de protocolos.
Da parte da região, temos sentido tem havido um carinho muito grande pela Instituição a todos os níveis. Por outro lado, numa localidade como Macedo de Cavaleiros, o Instituto Piaget é a maior entidade empregadora, o que acaba por ter um peso económico e um impacto e uma aceitação por parte da população muito grande, uma vez que somos uma mais valia e um factor de desenvolvimento para toda esta região.
Temos vindo a verificar que a maioria dos nossos professores que tem referências com a região, acabam por se instalar na região, e um grande número dos nossos alunos acaba também por ficar na região. Tudo isto é um factor importante e decisivo em termos de desenvolvimento, não só na formação, mas também noutras áreas. Por exemplo, neste momento uma área que é também importante referir, nós desenvolvemos uma parceria com as escolas do primeiro ciclo da comunidade nas áreas da matemática e das ciências da natureza. Por outro lado, uma vez que somos uma instituição que tem uma rede de comunicações, nomeadamente com a internet, todos os computadores estão ligados à rede e nós facultamos isso ás escolas do primeiro ciclo e não só. Nomeadamente ás aldeias mais isoladas damos facilidades para que possam vir nos períodos de férias fazer uma iniciação à internet e fornecemos os espaços para que possam fazer essa aprendizagem. Em termos das novas tecnologias temos também já algum significado em termos da comunidade.

Eduardo Beira:
Muitos dos alunos das instituições do ensino superior aqui em alto Trás-os-Montes não são da região...

Luís Cardoso:
A maioria não é daqui. O que nos é dado perceber junto dos nossos alunos é que a maioria é da zona a que chamamos a “rota do vinho verde”, ou seja, por um lado desde Amarante até Braga e por outro lado, um pouco para sul do Porto.

Eduardo Beira:
Quando os alunos acabam os seus cursos, geralmente regressam aos pontos de origem?

Luís Cardoso:
Nem sempre. Nós vamos acompanhando.
Temos um grande núcleo que se instala nos Açores e na Madeira, e o que é curioso é que a maioria desse grupo não volta, fica por opção. Existe uma grande identificação, nomeadamente entre aqueles que são naturais, ou daqui de Trás-os-Montes, ou das regiões do interior, nomeadamente da Beira, e a população das ilhas. Quando se dizia há uma década atrás e ainda hoje se fala, nas acessibilidades, é evidente que quem vivia em Trás-os-Montes há dez, vinte, trinta anos, vivia numa situação um pouco parecida a quem vive nas ilhas, um pouco entregue a si próprio e talvez daí resulte uma identificação tão grande.
Por outro lado o que nos damos conta, é que ao nível dos técnicos de saúde estão espalhados por todo o país, e não achamos uma diferença significativa. O que constatamos por dados é que todos aqueles que são da região e que fazem a sua formação na região, 99% querem voltar e radicar-se cá. Temos também por outro lado um leque de alunos que já tiveram algumas experiências profissionais e só fizeram a sua formação no ensino superior depois dessas experiências e o que damos conta é que só o fazem porque é uma instituição muito próximo da sua residência.

Eduardo Beira:
Como é que vê a qualidade de vida hoje em dia em Alto Trás-os-Montes?

Luís Cardoso:
Eu sou um pouco suspeito porque morei muitos anos em Lisboa e fiz uma opção de vida precisamente por considerar que em Trás-os-Montes existem excelentes condições de vida. O tempo aqui corre mais devagar, temos tempo para tudo, para desenvolver as nossas actividades profissionais e pessoais e tempos de lazer. E damo-nos conta que as acessibilidades já são boas e facilmente nos deslocamos aos grandes centros se houver algum interesse da nossa parte em fazê-lo. Eu penso que o futuro da qualidade de vida está nas cidades médias do interior, e há também um papel importante ao nível da preservação daquilo que é nosso, que é genuíno e daquilo que no fundo ainda atrai muitos daqueles que quando jovens partiram à aventura de outras paragens, mas existe um grande sentimento de voltar um pouco ás origens.